A nossa Amazônia!

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Foto: Arnoldo Santos/ Lago do Curuçá/ Rio Solimões/ Município do Careiro

terça-feira, 23 de outubro de 2012

O povo viu Dilma. Mas o povo viu a si mesmo?

Chegada da comitiva de Dilma ao "passarinho"
Foi com alguns minutos que parei de prestar atenção aos discursos para me tocar onde estava. As vias asfaltadas que passam ao redor do igarapé do Passarinho, uma obra de urbanização do Governo do Amazonas na zona norte de Manaus, estavam lotadas. Fui cobrir o comício da candidata Vanessa Grazziotin com a presença da presidenta Dilma Rouseff. 
Estava com minha filha, Júlia, que não tinha com quem ficar à noite me esperando. Credenciamento, eu tinha. Ela, claro, não. Nem ía pedir pra darem. Então, encostei o carro uns 300 m distante. Foi o até onde deu pra chegar. Mas como o que mais me interessava era a gravação dos discusos, a mim bastava ficar próximo do som, que era muito grande. Paramos na lateral do palco. Havia uma multidão de seguranças, entrelaçados em uma estrutura que mais parecia "brad" para gado passar. 
Mas o povo se espremia num corredor que sobrou da via falando alto, passando a todo momento, como era de se esperar. Velha com menino, menino com pai, menino chorando, namorados adolescentes, muitos, muitos jovens. E trabalhadores de todos jeitos, caras e cheiros. Cheiros, sim, porque cachaça é sentida de longe para quem conhece, como eu.
Gravando as falas, vi que meus colegas jornalistas estavam todos num palanque, frontal ao palanque principal. Filmando, prestando atenção, outros escrevendo, outros só esperando terminar a pauta. Fiquei pensando sobre o que estava fazendo ali, naquela muvuca, empurra-empurra, ainda com filha. Forcei a barra para me dar uma explicação útil, um lado bom daquela minha abestalhação momentânea. Aí, uma frase me permeiou a mente: "estou vendo a coisa pelo ângulo do povo, não dos jornalistas lá de cima do palanque". Claro que não é uma setença de cláusla pétrea, imutável, nem mesmo condenatória à versão colhida pelos demais colegas. Mas foi um toque de mim pra mim mesmo sobre a possibilidade de ver diferente a coisa. 
Como já sabia que essa conjectura aqui não iria para a matéria oficial, enviada ao Terra, nem me contive em angústias. E ao olhar para Júlia, vi um largo sorriso de uma criança quase adolescente que mais parecia estar numa festa, sem se importar com o empurra, a falta de conforto. Parecia estar gostando daquele passeio antropológico.
Chamei-a e cochichei. "Olhe ao seu redor. Preste atencão nas roupas, nos cabelos, nos tamanhos e cores. Preste atenção até  nos cheiros diferentes. Este é o povo que aquele pessoal lá de cima tem de resolver", disse a ela. Falei isso porque nós, jornalistas, às vezes acabamos escrevendo somente sobre pessoas inatingíveis. Sobre casos que a gente não vê, vida que a gente não testemunha. E visões que a gente não conhece.
"O que essa mulher tá falando?", resmunga a senhora acompanhada de um jovem casal. "Ela tem de explicar melhor para o povo. Porque o povo tem de abrir a mente pra não ser enganado", diz a moça ao lado. Enquanto isso, o rapaz começa a gritar  "valeu, Dilmmmmaaaaa". Não dá pra entender muito se eles entenderam. Mas sem querer estar subestimando a capacidade do povo, escolho a opção que sim.
Uma cena vai ficar entre as salvas no meu HD da alma. Um senhor, bêbado, para ao meu lado na cerca. Grita para um rapaz franzino, contratado como segurança terceirizado.
"Ei, zé buceta, vem cá, caralho...que eu sou de pernambuco...quero entrar nessa porra...Vem cá, seu zé buceta mesmo... que eu vou aí te pegar". E gritava com a carteira aberta. Sei lá se tinha sequer dinheiro. Não tive coragem de olhar. Não porque estava com medo, porque não estava. Por puro pudor de não querer invadir o momento etilizado daquele homem. Ele queria "pagar um ingresso" pra entrar na área dos VIPS.
Foi assim. Ver a matéria pelo angulo dos personagens da matéria foi interessante. Depois do final, o povo começou a sair ao som do forró de propaganda da candidata. Será que entendeu a mensagem, seja ela qual tenha sido? Acho que tenho de voltar lá pra perguntar...
Detalhe: deu tempo de fazer tudo isso porque meu companheiro, Rômulo Araújo, estava se ferrando lá na muvuca fazendo as fotos e colhendo mais informações para possível complemento. Como disse, a foto é dele. E a matéria que rendeu foi esta http://noticias.terra.com.br/eleicoes/2012/am/manaus/noticias/0,,OI6247963-EI20631,00-Dilma+aposta+em+popularidade+para+eleger+prefeita+em+Manaus.html